O ano de 2020 começou com um susto atrás do outro para a economia: impacto do coronavírus sobre as bolsas, alta do dólar e, no dia 9 de março, a bolsa de valores brasileira entrou em circuit breaker após uma desvalorização de mais de 10%. Nessa queda, refletida também em outras economias ao redor do planeta, o petróleo apareceu como personagem principal.
O problema é que o mercado financeiro é complexo. Por isso, muita gente não sabe o que está acontecendo, gerando um campo fértil para informações equivocadas circularem e alimentarem a confusão.
Para ajudar a esclarecer, entenda, a seguir, de que forma o petróleo impacta as bolsas.
O papel do petróleo na economia
O petróleo é uma das principais commodities (ou matérias-primas) negociadas no mundo. Em 2015, ele movimentou mais de US$ 1,7 trilhão na economia global – para efeito de comparação, todo o mercado de metal, somado (incluindo ouro, alumínio, ferro etc), representa apenas um terço disso.
Ou seja: qualquer flutuação nesse mercado que saia da curva esperada tem efeitos imediatos em escala mundial – afinal, praticamente todos os países do mundo participam da compra e venda.
Como é definido o preço do petróleo?
O preço do barril de petróleo é estabelecido no mercado internacional e, portanto, em dólar.
A definição do valor depende de vários fatores, mas é essencialmente baseada em um modelo econômico simples: a lei da oferta e da demanda.
Isso significa que existe um setor com enorme influência sobre esse preço: os grandes países produtores, parte deles representados pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), criada na década de 1960 para fortalecer as nações produtoras – já que, nessa época, quem controlava o mercado eram as empresas americanas e europeias.
Como a Opep mexe o ponteiro
Hoje, fazem parte da Opep 15 países, incluindo os cinco originais: Arábia Saudita (o principal produtor), Irã, Kuwait, Iraque e Venezuela.
Por estarem entre os maiores exportadores do mundo, eles conseguem tomar decisões que impactam muito o mercado do petróleo.
Por exemplo: de janeiro de 2017 a julho de 2018, as nações da Opep vinham mantendo a produção média relativamente baixa, buscando diminuir a oferta para aumentar o preço – o valor do barril chegou a US$ 80 em maio de 2018, comparado a US$ 46 no fim de 2016.
Eles são os únicos produtores? Não. Os Estados Unidos, por exemplo, produzem mais petróleo do que a Arábia Saudita, mas consomem tanto internamente que ainda precisam importar. Outros países, como Rússia, China, Brasil e México, também figuram na lista.
Acontece que, juntas, as nações da Opep conseguem unir um poder de barganha enorme quando decidem algo. Somadas, elas representam aproximadamente um terço de toda a produção de petróleo do mundo.
OK, mas o que isso tem a ver com a queda das bolsas?
Em linhas gerais: com a disseminação do coronavírus Covid-19, a procura por petróleo no mundo caiu – afinal, em países bem afetados pela doença, como China, Coreia do Sul e Itália (sendo que os dois primeiros estão entre os maiores consumidores do mundo), as determinações de quarentena significam menos gente circulando e, consequentemente, menos demanda por combustível.
Ou seja – o estoque de petróleo vem aumentando e o preço do barril começou a cair. No meio de fevereiro, chegou a US$ 53, tendo começado 2020 a US$ 66.
Com isso no radar, os grandes produtores começaram uma discussão sobre que medidas tomar. Até a semana passada, os dois principais protagonistas, Arábia Saudita e Rússia, defendiam pontos de vista distintos:
- A Arábia Saudita propunha uma diminuição na produção, para impedir o acúmulo de estoque e, consequentemente, a maior queda de preços.
- A Rússia propunha deixar o preço cair para estimular a competição com o xisto, outro produto do mercado de energia.
Ainda que não seja uma nação membro da Opep, a Rússia é uma aliada da organização e rejeitou a proposta da Arábia Saudita.
A Rússia, a Arábia Saudita e a crise
As negociações chegaram em seu limite no fim de semana do dia 8 de março, quando a Arábia Saudita começou uma guerra de preços: o país anunciou publicamente que iria aumentar a produção e diminuir os preços.
O problema: com isso, houve uma reação em cadeia que fez a cotação do petróleo despencar. O preço chegou a cair 30% no início da segunda-feira, dia 9, passando de aproximadamente US$ 45 para US$ 34.
Com isso, as bolsas do mundo inteiro sofreram impacto – a de Tóquio caiu cerca de 5%, a de Sydney, 7% e a de Londres, na casa dos 6%.
No Brasil, a queda chegou a mais de 10%, o que ativou um circuit breaker na B3 – ou seja, as negociações foram interrompidas por um período de 30 minutos (explicamos esse conceito em mais detalhes aqui). O mesmo aconteceu nos Estados Unidos, que não ativava um circuit breaker há mais de 20 anos.
Por que as bolsas caíram desse jeito?
Países que produzem petróleo e têm parte de sua receita dependente dos royalties de produção foram fortemente afetados – afinal, se o preço do barril despenca subitamente, essa entrada de dinheiro diminui sem planejamento.
O efeito imediato disso é o afastamento dos investidores, que, ao verem a instabilidade, vendem ações e outras aplicações de maior risco. Com essa liquidação acelerada de ativos, as bolsas perdem valor.
É preciso lembrar, também, que muito do que acontece nas bolsas de valores é movido pelas percepções dos investidores, que já vinham em um clima de insegurança devido ao coronavírus. A pouca confiança no mercado acabou gerando mais instabilidade.
O dia depois da queda
No dia seguinte, os mercados ensaiaram recuperação: no Brasil, a Bolsa chegou a uma alta de mais de 4%, o dólar baixou e as ações da Petrobras (que, na véspera, tinham despencado mais de 30%) voltaram a subir. O mesmo aconteceu em países asiáticos e europeus.
A expectativa ao redor do mundo é que, para prevenir uma nova crise, os governos e organizações mundiais preparem medidas de estímulo para proteger a economia.
O importante, nesse cenário, é não entrar em pânico – e a melhor forma de fazer isso é se informando. Temos alguns artigos que ajudam a entender o funcionamento da bolsa e o impacto do coronavírus. Que tal começar por eles?