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Álbuns de figurinhas, mo...

Álbuns de figurinhas, moedas, bonecos: quanto custa ser um colecionador?

Moedas, álbuns de figurinhas, bonecos, selos… Tem colecionador para todo tipo de objeto. Entenda o que move os colecionadores e quanto eles estão dispostos a gastar.



Histórias de colecionadores

Quanto você pagaria por uma moeda antiga, um cartão telefônico, um imã de geladeira ou um álbum de figurinhas? Para muita gente, essas coisas não valem nada ou muito pouco, mas para outras elas não têm apenas um alto valor financeiro, mas emocional. 

Há quem diga que colecionar é uma obsessão, um passatempo ou até bobagem. Mas estudiosos de diferentes áreas, como filosofia, sociologia, psicologia e até arte, acreditam que há muita ciência envolvida nesse comportamento. E essa ciência já tem até nome: se chama colecionismo. 

O colecionismo estuda o que existe por trás do ato de colecionar. Você já ouviu muitas histórias daqueles colecionadores profissionais, que praticamente vivem disso. Mas o que pensam, como vivem e quanto gastam os colecionadores comuns – aqueles que têm os mesmos boletos que você para pagar no final do mês? Conheça, abaixo, algumas dessas histórias. 

O que se passa na cabeça de um colecionador?

Existem muitos fatores que ajudam a explicar esse desejo por colecionar, mas ainda não há um consenso sobre isso entre quem estuda o colecionismo. 

No livro “Ter e Manter: uma história íntima de colecionadores e coleções”, o historiador alemão Philipp Blom escreveu que o colecionismo está bem longe de ser um simples passatempo. Ele diz que esse hábito tem relação com vários sentimentos, principalmente o prazer. 

Do ponto de vista da psicanálise, existem alguns caminhos que podem ser investigados, segundo Aurea Moneo, psicanalista com ênfase na clínica psicanalítica e professora do Centro de Formação em Psicanálise Clínica Illumen, de São Paulo.

Ela afirma que não dá para explicar o que se passa na cabeça de um colecionador sem levar em conta que cada indivíduo é único e cheio de nuances. Ou seja, o motivo que faz uma pessoa colecionar pode ser bem diferente do motivo de outra pessoa. Mas dá para levantar algumas hipóteses.  

“O ato de colecionar pode revelar uma relação de objetivo, uma forma de dar vazão a um prazer muito grande, experimentado lá atrás na infância. E que ele hoje busca repetir para experimentar essa sensação boa novamente, ou mesmo uma forma de transformar o incontrolável e desprazeroso, vivenciado lá no passado, agora em algo controlável e prazeroso”, explica.    

É o prazer, inclusive, uma das principais diferenças entre um colecionador e um acumulador, por exemplo. O acumulador tem uma relação de dependência e ao mesmo tempo de desprazer com o objeto que acumula. Já o colecionador gosta do que coleciona e não sente que esse objeto afeta outras áreas da sua vida.

“Quer trocar uma figurinha aí?”

Só se fala em álbum de figurinhas da Copa do Mundo FIFA™, então nada mais justo do que investigar a mente dos colecionadores ávidos por ele.

A Panini, patrocinadora oficial do álbum, mal começou suas vendas e já existem grupos nas redes sociais com mais de 50 mil pessoas destinados a marcar encontros de trocas de figurinhas.

Essa paixão é tão grande que movimenta muito dinheiro. Em sites de compra e venda, por exemplo, há anúncios no valor de R$ 500 mil por um conjunto de 79 álbuns completos de diversos torneios, entre eles 17 álbuns da Copa do Mundo FIFA™. Você não leu errado: R$ 500 mil. 

Isso sem falar nas edições consideradas históricas: o álbum do mundial de 1966 aparece à venda por R$ 36 mil. O de 1962 está um pouquinho mais em conta: R$ 7.650.

Mas tem gente disposta a pagar tudo isso por um álbum?

Tem sim, e geralmente são colecionadores profissionais, que vivem disso, e buscam peças únicas, raras e exclusivas. 

Mas dá para manter uma coleção sem precisar gastar rios de dinheiro. O álbum mais caro na prateleira do analista de e-commerce Fabio Sobral Soares de Lima, de 29 anos, é o do Campeonato Brasileiro de 1990, que custou R$ 380 e foi completado dentro do orçamento. 

Corintiano, Fabio decidiu colecionar os álbuns de quando o seu time foi campeão brasileiro para relembrar o elenco e os grandes momentos daqueles anos. E o álbum do torneio da década de 90 , segundo ele, valeu cada centavo.

Fabio Lima, de 29 anos, com parte de sua coleção de álbuns. (Arq. pessoal)

Coleções reforçam memórias afetivas

Fabio começou a colecionar álbuns de futebol em 2001, quando tinha apenas oito anos. O futebol sempre foi o esporte que o conectava à família. No começo, ele gostava de juntar aqueles montes de figurinhas para brincar de bafo na escola, mas foi a Copa do Mundo FIFA™ de 2002 que fez ele se apaixonar de vez pelos álbuns.  

“Foi o ano que eu adquiri esse encanto maior pelas figurinhas. Eu colecionava junto com o meu pai. Então, tenho boas lembranças e memórias dos jogos de madrugada. Acordava, assistia aos jogos, colava figurinha, com aquela expectativa de conseguir completar o álbum.”

Fabio Lima

Fabio tem 25 álbuns de diversos campeonatos, e se orgulha de um livro da Panini que reúne os álbuns de figurinhas completos dos mundiais de 1970 até 2010.

Ele conta que já foi mais impulsivo na hora de aumentar sua coleção, mas que hoje faz um planejamento para sustentar sua paixão, além de ser mais criterioso na hora de escolher qual álbum vai entrar na prateleira. 

Quanto custa colecionar álbuns de figurinhas?

Embora nunca tenha feito as contas exatas, Fabio estima que já desembolsou em torno de R$ 5 mil com essa atividade ao longo dos anos. Mas para ele o que conta não é o dinheiro que ele gasta, mas as lembranças que acumula.  

“Tenho boas memórias. A última de 2018 foi bem legal. Meu pai é taxista e estava sempre dirigindo pela cidade, e quando passava por algum ponto de troca, ele parava para conseguir uma figurinha que estava faltando. Eu também sempre estava conseguindo alguma e a gente ia se comunicando para tentar completar a coleção”, afirma.  

“Eu sou um colecionador que compra muita figurinha, troco muita figurinha, gosto muito de participar de pontos de troca, sempre estou agitando familiares, pessoas no trabalho. Acho que coleções de figurinhas, como outras coisas, também servem para unir as pessoas, trazer momentos de distração, descontração e união.” 

Fabio Lima

Memórias valem mais do que dinheiro

São justamente essas histórias e memórias que impediram Fabio de vender alguns álbuns num período em que ele estava precisando de dinheiro. 

“Quando eu folheio as páginas, vou lembrando de muita coisa e acho que aquilo não se resume a um álbum com figurinhas. Tem muita memória ali, muita história, lembranças familiares, afetivas e momentos do próprio esporte. Acho que colecionar álbum de figurinha também é colecionar memória, histórias e registrar essas histórias de alguma forma. No futuro, minha filha, meus netos vão ter contato com isso, e também acessar esse pedacinho da história, dos momentos que a gente viveu”, conta Fabio. 

Guardar um pedacinho da história, seja ela do esporte ou pessoal, é um motivo comum entre muitos colecionadores. Mas também há aqueles que têm outras intenções com suas coleções.

“Vai que isso se valoriza lá no futuro?”

Além do fator emocional, muita gente que coleciona também cria uma expectativa de ver sua coleção valer dinheiro no futuro. A publicitária Mariana Martins de Oliveira, de 28 anos, é uma dessas pessoas. Para ela, colecionar é uma forma de investimento de longo prazo. E, como boa investidora, Mariana gosta de diversificar.

A primeira coleção da publicitária foi de cartões telefônicos, ainda criança. A paixão por colecionar era tão grande que ela chegou a ganhar uma pasta de selos de uma pessoa da família. Logo, passou a colecionar botons, imãs de geladeira, action figures… 

Apesar dessa paixão, Mariana conta que não faz loucuras com o orçamento para aumentar suas coleções. O item mais caro que já pagou foi um boneco que custou R$ 100. 

“O meu orçamento costuma ser bem organizado. Eu tenho minha reserva de emergência, e sei quanto gasto por mês. Então, me organizo e sei que posso gastar determinado valor naquele mês”, diz. 

Mariana de Oliveira, de 28 anos, exibe uma das moedas mais antigas de sua coleção. (Arq. pessoal)

Coleção de moedas pode ser investimento de longo prazo 

Além de controlar o orçamento para aumentar suas coleções, Mariana espera fazer dinheiro com algumas peças um dia. 

“Eu já ganhei mais de R$ 200 vendendo esses itens que eu comprava para esse fim mesmo: revender. Comprava dois: um pra mim e um para revenda”, afirma. 

A coleção que ela mais tem expectativas de valorização é a de moedas e notas. Ela não sabe ao certo quantas notas tem, mas só de moedas são mais de 300, de países como Espanha, Argentina, Portugal, Peru, Chile, além do Brasil. As mais antigas são da década de sessenta. Entre as notas, tem até dinheiro da Turquia. 

Para ela, essas coleções são uma possibilidade de ganhos futuros e também uma forma de guardar um pedacinho do passado. 

“Eu coleciono, primeiramente, porque me faz bem. E acredito também que alguma coleção minha pode se valorizar no futuro. É uma forma de investir pensando no longo prazo. Imagina os meus filhos pegando uma moeda que tem 100 anos de idade. Também é uma forma de a gente guardar um pouco do passado.”

Mariana de Oliveira

“Boleto” e critério são base para aumentar coleção sem se enrolar

O editor de vídeos Artur Andrade, de 30 anos, coleciona action figures, aquelas pequenas estátuas de personagens da cultura pop, há 10 anos. Só de funkos, que são um tipo de boneco, ele catalogou 151 peças. 

Ele conta que se descobriu um colecionador sem querer, e que comprava sem grandes pretensões e muito mais por impulso. Ele já chegou a pagar por um action figure um valor seis vezes maior do que o preço original. Com o tempo e a experiência, além de reservar uma parte do orçamento para manter sua coleção, como se fosse um “boleto” pessoal, ele também ficou mais seletivo.

“Eu comprava esses itens com uma frequência muito maior no passado, comprava toda semana. Hoje em dia, passei a comprar com uma frequência bem menor”, conta Artur. 

“Acabo separando uma parte do orçamento para a coleção, mas eu sinto que acabei me tornando mais criterioso no que eu quero adquirir. Então, por mais que eu separe um valor, em alguns meses, eu acabo não gastando tudo.” 

Artur Andrade
Artur Andrade, de 30 anos, coleciona action figures há dez anos. (Arq. pessoal)

Se não afetar seu bolso, colecionar é saudável

Artur começou a colecionar porque gosta de acompanhar o mundo geek e seus personagens. E ele não está sozinho. Só no ano de 2021, o setor de licenciamento no Brasil, que reúne os produtos ligados aos personagens mais famosos, faturou mais de R$ 21 bilhões. O número representa um crescimento de 5% em relação a 2020. 

Agora, falando de coleções em geral, não existe hoje um só número que represente todo o mercado Afinal, tem coleção de todo tipo.   

A psicanalista Aurea Moneo afirma que, se não afetar negativamente a vida do colecionador, o ato de colecionar é parte da vida e até saudável.  

“Para quem se sente bem em colecionar, desde que não comprometa grande parte dos seus recursos financeiros ou represente um gasto de tempo ou de dedicação, que prejudique sua vida de relação, pode ser uma solução interessante de gozar da vida”.  

Aurea Moneo, psicanalista

*Ilustração de Ana Beatriz

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