Toda vez que seu celular ou um aplicativo disponibiliza uma nova versão, você já sabe que alguma coisa vai mudar. Pode ser um erro que foi corrigido, uma função nova, um jeito diferente de ver o app ou uma mudança completa. Essas atualizações são frequentes e têm a intenção de trazer alguma melhoria para o usuário.
No mundo das criptomoedas, isso também acontece. As melhorias são realizadas nas redes blockchain, que são a tecnologia por trás dos criptoativos. Mudanças nessas redes podem afetar todo o mercado. E uma delas é bem esperada: o “the merge” da rede Ethereum, a blockchain da criptomoeda ether (ETH).
Desde que foi criada, em 2015, a rede já previa uma grande atualização no seu sistema. “The merge” significa “a fusão” em português. Ela vai mudar o sistema de validação das transações dentro da rede, afetando a oferta da ether (ETH), a criptomoeda nativa da Ethereum.
Segundo a própria Ethereum, essa mudança acontece entre os dias 10 e 20 de setembro de 2022. Entenda, abaixo, o que é o “the merge”, como ele afeta o mercado de criptomoedas e os efeitos dela na ether.
O que é uma blockchain?
Blockchain – que significa “corrente de blocos”, em português – é a tecnologia por trás das criptomoedas e funciona como uma espécie de banco de dados.
Nesse sistema, é possível fazer transações de ativos digitais (como documentos e as próprias criptomoedas) sem intermediários, de qualquer lugar do mundo e de uma forma transparente.
Dentro de uma blockchain, as informações enviadas são como pedaços de código que são checados, validados e “trancados” dentro de blocos. Uma vez lá dentro, essas transações não podem mais ser alteradas.
Qualquer pessoa que acessa uma blockchain consegue ver as transações feitas na rede, mas não tem acesso a quem realizou essas operações, quem as recebeu e nem qual ativo foi enviado.
Isso acontece porque a blockchain usa criptografia para proteger esses dados. Criptografia é uma camada de segurança que torna muito difícil qualquer tipo de fraude.
O que diferencia uma blockchain da outra?
De forma simplificada, um dos aspectos que diferencia uma rede blockchain da outra é a forma como os dados são validados dentro dela. Existem diferentes tipos de validação, mas os dois mais comuns são o proof of work (ou PoW) e o proof of stake (ou PoS).
O que é e como funciona o proof of work?
O proof of work, ou PoW (prova de trabalho, em português), é a forma de validação de dados mais conhecida no universo cripto. Ela é usada na blockchain do bitcoin, por exemplo, e funciona assim: quando uma transação é feita em uma blockchain, os dados e informações dessa transação precisam ser checados, validados e trancados em um bloco.
Cada bloco é encaixado a outro formando, assim, uma cadeia de blocos, impedindo que essa informação seja acessada ou alterada.
Quem faz isso são os mineradores, usuários da rede. Para fazer essa checagem e encaixar um bloco no outro, eles usam computadores com alta capacidade de processamento para resolver contas matemáticas complexas.
Na validação de prova de trabalho (proof of work), os mineradores concorrem entre si para resolver essas contas. Ou seja, eles tentam validar uma transação ao mesmo tempo. Quem conseguir fazer isso primeiro, recebe a criptomoeda nativa da rede como pagamento.
Por exemplo: na rede Bitcoin, os pagamentos são em bitcoin; na rede Ethereum, são em ether.
Esses pagamentos são feitos de forma automática. Assim, quando um minerador resolve essas contas, fecha um bloco e o encaixa na corrente, a blockchain gera criptomoedas novas automaticamente. Esse processo todo é chamado de mineração.
O que é e como funciona o proof of stake?
O proof of stake, ou PoS (prova de participação, em português), também é uma forma de validação de dados dentro de uma blockchain. Mas diferentemente do proof of work, na prova de participação não há mineração e nem mineradores. Não há contas complexas a serem resolvidas.
Na validação de proof of stake, a blockchain envia um bloco especificamente para um validador. Ele terá um tempo para checar a transação, assinar e enviar para outros validadores concordarem com essa validação. Tudo é feito de forma automática.
Ou seja, não é uma pessoa que escolhe um validador. Isso é feito a partir de algoritmos da rede e de acordo com o histórico dessa pessoa.
O que é a Ethereum?
Existem várias redes blockchain. A rede do bitcoin é a primeira e mais conhecida. A Ethereum, por sua vez, é a segunda mais importante. Concebida em 2013, mas lançada efetivamente em 2015, a Ethereum é considerada uma evolução da rede do bitcoin por ser programável e permitir que outros projetos sejam criados dentro dela.
Isso fez com que outras criptomoedas e tokens surgissem de forma mais acelerada. Hoje, entre 60% a 80% dos projetos de criptoativos são criados dentro da Ethereum.
Exatamente por isso, qualquer mudança na lógica de funcionamento dessa rede pode alterar todo o mercado. E é isso o que está acontecendo agora.
O que é “the merge” e o que muda na Ethereum?
“The merge” significa “a fusão”, na tradução para o português. O que está acontecendo agora é que a rede Ethereum vai sair da validação do tipo de proof of work para proof of stake.
“Essa transição já era programada desde o início da rede, porque os desenvolvedores já sabiam do impacto que o proof of stake tem. Mas a tecnologia para fazer isso ainda não estava pronta. Por isso eles começaram com o proof of work. Agora, a tecnologia já foi desenvolvida”, explica Lucas Santana, analista de research da Hashdex, empresa gestora de criptoativos.
Veja as verdades e as mentiras sobre o que muda com o “the merge”, segundo o especialista.
A mudança vai reduzir o consumo de energia da rede
Verdade. No proof of stake não existe mais a lógica de mineração, porque não há equações para serem resolvidas. Ou seja, não existem milhares de mineradores usando computadores de alta potência. Por isso, a Ethereum estima uma redução de 99,95% no consumo de energia da rede.
Os pagamentos serão menores para os validadores
Verdade. Por consumir menos energia e tirar as equações complexas do processo, a validação fica mais simples. Por isso, a recompensa também cai. Hoje, os mineradores ganham 2 ethers (ETH) por bloco minerado mais as taxas de prioridade.
Essa taxa é uma espécie de gorjeta que os usuários pagam para que sua transação seja priorizada na fila de validação. Quem paga mais, vai furando fila.
Depois do “merge”, o pagamento para os validadores vai cair para 0,2 ETH mais as taxas.
Vai ficar mais barato fazer transações na rede
Não exatamente. Segundo Lucas Santana, os blocos na Ethereum são pequenos. Por isso, há uma competição entre os usuários por espaço nesses blocos. Para terem suas transações validadas rápido, eles pagam aquela espécie de gorjeta.
“Em 2021, houve muito congestionamento na rede e as taxas chegaram a dezenas e centenas de dólares por transação. Isso é um grande gargalo.”
Lucas Santana, da Hashdex
E esse problema não deve ser resolvido agora, porque o “merge” não altera o tamanho dos blocos.
“O tamanho dos blocos importa porque quanto maior o bloco, maior fica a blockchain. E se ela for muito pesada, limita o acesso das pessoas e a rede ficaria menos descentralizada”, explica.
A mudança vai aumentar a velocidade e o número de transações
Não imediatamente. Contudo, o “merge” abre espaço para uma nova atualização no médio e longo prazo, chamada “sharding”, que significa fragmentação em português.
“Imagine que as transações na Ethereum caminham numa rodovia de faixa única. Com o ‘sharding’, você vai ter 64 faixas para transitar e não mais uma. Se existem mais faixas, ocorrem menos filas e menos congestionamento. Assim, as pessoas vão pagar taxas menores. Espera-se que isso aumente a escala da Ethereum no futuro”, explica Lucas Santana.
Ou seja, o “merge” não altera nada para usuários e desenvolvedores da rede no curto prazo, mas é a base para mudanças profundas no médio e longo prazo.
“É uma atualização super importante, prevista há anos, mas os principais impactos não serão vistos no curto prazo. A Ethereum é uma rede que está em constante melhoria e tudo isso é uma construção. Após a migração, deve ter mais volatilidade e pode ser até que o preço caia no curto prazo, mas a rede está ficando mais forte em fundamentos. E o mercado cripto funciona a partir desses fundamentos”, explica o especialista.
Como isso afeta minhas criptomoedas?
O mercado cripto é muito volátil. Ou seja, o preço das criptomoedas oscila muito, a cada minuto. Por isso, não tem como prever exatamente o que pode acontecer com o preço. Mas é possível afirmar que, com o “merge”, a quantidade de ether no mercado vai cair.
“Estima-se que após a migração, a emissão de novos ethers vai cair 90%, justamente porque o custo do validador vai ser menor. Hoje, o estoque da criptomoeda cresce entre 4,5% e 5% ao ano. Agora, vai crescer entre 0,45% e 0,5% ao ano.”
Lucas Santana
A rede já havia implantado uma mudança para controlar a quantidade de ether no mercado. Na hora de fazer uma transação na Ethereum, o usuário paga uma taxa de base mais aquela gorjeta. Esse pagamento é feito em ether. A partir de agosto de 2021, a cada bloco minerado, essa taxa de base é “queimada”. Ou seja, o ether usado para pagar essa taxa deixa de existir.
Isso não será alterado com o “merge”. Por isso, o processo de queima que já existe desde 2021 e o pagamento menor aos validadores que vai ocorrer depois do “merge” vão reduzir o estoque da criptomoeda no mercado.
“Vai ter muito menos ether entrando em circulação, e isso pode ter um impacto positivo no preço”, afirma Lucas Santana. Esse possível aumento no preço da ether no longo prazo tem relação com a velha lei da oferta e demanda. Com menos moedas em circulação, o preço tende a subir, mas só se houver demanda pela criptomoeda.
Muda alguma coisa para os clientes do Nubank Cripto?
O Nubank Cripto é a função para comprar e vender bitcoin e ether pelo aplicativo do Nubank, a qualquer hora e em qualquer dia. Com o “merge”, nada muda para os clientes que compraram ou querem comprar e vender ether (ETH) pelo app.
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